Ante o crescente número de ações decorrentes do alegado "erro médico", resolvi escrever este pequeno arrazoado para tratar da responsabilidade civil do médico, no tocante às cirurgias plásticas.
A obrigação médica configura-se como obrigação de meio, exceto em cirurgias plásticas estéticas, quando a responsabilidade passa a ser de resultado.
Neste ponto, imperioso destacar que existem duas categorias de cirurgias plásticas, as reparadoras e as estéticas, sendo que as primeiras permanecem como obrigação de meio e as segundas (estéticas) como obrigação de resultado.
Nas cirurgias plásticas reparadoras, ao contrário das estéticas, a responsabilidade incidente na espécie não é objetiva, mas, sim, subjetiva, em razão de expressa disposição legal nesse sentido, in verbis:
"Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
(...)
§ 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa."
Lado outro, as cirurgias plásticas estéticas possuem o caráter da responsabilidade civil objetiva, conforme entendimento exposto pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça): “De acordo com vasta jurisprudência, a cirurgia plástica estética é obrigação de resultado, uma vez que o objetivo do paciente é justamente melhorar sua aparência, comprometendo-se o cirurgião a proporcionar-lhe o resultado pretendido”, decidiu o tribunal ao analisar o AREsp 328.110.
Ademais, cumpre salientar que a relação jurídica havida entre médico e paciente, consoante pacificado entendimento do STJ, é regida pelo Código de Defesa do Consumidor, pois há o oferecimento de serviço pelo médico, de maneira habitual e remunerada, enquadrando-se assim na figura do fornecedor, e o paciente, por sua vez, se encontra na posição de seu destinatário final, amoldando-se a figura do consumidor, pois não o recebe como insumo de sua atividade, ex vi:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ERRO MÉDICO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DO DANO. ACÓRDÃO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83/STJ. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos serviços médicos, inclusive o prazo prescricional previsto no artigo 27 da Lei 8.078/1990. Incidência da Súmula 83/STJ.
2. A alteração do entendimento adotado pela Corte de origem, acerca da data em que ocorreu a ciência inequívoca da ocorrência de erro médico, dando início à contagem do prazo prescricional quinquenal, demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada na via estreita do recurso especial, conforme o óbice previsto no enunciado n. 7 da Súmula deste Tribunal Superior.
3. Razões recursais insuficientes para a revisão do julgado.
4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1127015/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/10/2017, DJe 27/10/2017)(g.n)
Assim, com fundamento no Código de Defesa do Consumidor, bem como pelo entendimento pacificado pelos tribunais superiores, o cirurgião plástico, ao oferecer seus serviços, compromete-se a alcançar o resultado estético pretendido. Caso ocorram falhas nos procedimentos ou os resultados não sejam obtidos, o cliente pode acionar a Justiça para reparar eventuais danos morais, estéticos e materiais, vez que, nestes casos, a responsabilidade do médico é objetiva.
E, ainda, sobre o tema, os Eminentes Drs. Cristiano Chaves de Faria e Nelson Rosenvald, entendem que:
"Já na obrigação de resultado, o devedor se obriga a alcançar determinada finalidade, sem a qual não será adimplente. Ou alcança o resultado ou terá de arcar com as consequências do inadimplemento. Enquanto na maioria das especialidades médicas (v.g., cirurgia geral, cardiologia, medicina intensiva), a responsabilidade do médico é circunscrita ao dever geral de diligência, agindo conforme o estágio atual de desenvolvimento da técnica, na cirurgia plástica, desprovida de finalidade terapêutica, surge a obrigação de resultado. Como bem esclarece Carlos Roberto Gonçalves,"os pacientes, na maioria dos casos de cirurgia plástica, não se encontram doentes, mas pretendem corrigir um defeito, um problema estético. Interessa-lhes, precipuamente, o resultado. Se o cliente fica com aspecto pior após a cirurgia, não se alcançando o resultado que constituía a própria razão de ser do contrato, cabe-lhe direito à pretensão indenizatória".(Cristiano Chaves de Faria e Nelson Rosenvald. Curso de Direito Civil. Vol. 3. Obrigações. Editora Atlas., p. 291/292)"
Portanto, em se tratando de obrigação de resultado, a responsabilidade do médico é presumida, recaindo sobre ele o ônus de demonstrar que os danos suportados pelo paciente advieram de fatores externos e alheios à sua situação profissional.
E mais, vale lembrar que, nesses casos, é possível cumular o valor da indenização por danos morais com os chamados danos estéticos, que devem ser fixados segundo os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, cuidando-se para que a indenização não propicie o enriquecimento sem causa do recebedor, bem como não se mostre irrisória a ponto de afastar o caráter pedagógico que é inerente à medida.
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